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A Eucaristia, listada como o terceiro dos sacramentos da Iniciação Cristã, é a interpretação da cruz de Jesus como ato de serviço, diaconia, de Jesus de Nazaré à humanidade.
Toda liturgia cristã encontra seu ápice e fonte na celebração da Ceia de Despedida de Jesus de Nazaré com seus discípulos, mas há duas celebrações em que se destaca especialmente o tema da própria Eucaristia: a celebração do Lava-pés, na Quinta-Feira Santa e a celebração de Corpus Christi, mais precisamente, Solenidade do Corpo e Sangue do Senhor. A celebração da Quinta-Feira Santa destaca dois aspectos fundamentais: o gesto de Jesus lavar os pés e a despedida de Jesus. A solenidade do Corpo e Sangue do Senhor quer ser um testemunho público da compreensão do significado da Eucaristia como presença continuada do Ressuscitado em meio à comunidade-Igreja. Trata-se da mesma Eucaristia com as mesmas dimensões presente em cada celebração ao longo do ano: a presença continuada de Jesus, concentrada na Liturgia, como serviço permanente à humanidade.
A dimensão servidora se evidencia no gesto de lavar os pés. Toda existência histórica de Jesus, é diaconia do Filho divino à criação. A Encarnação representa o momento inicial do amor insuperável de Deus a toda a realidade criada, porque significa a entrega total ao ponto de Ele, Filho, tornar-se, ser feito criatura. Representa o horizonte, o sentido, presente desde todo sempre na relação divina com a realidade não divina, pois tudo foi feito n’Ele e Ele é a cabeça de toda criação. Ao longo de sua existência, Jesus concretiza essa condição no amor incondicional às pessoas concretas. Ele mesmo adota como critério de sua vida uma forma servidora do Judaísmo. Acolhe o batismo de João Batista como sendo um chamado ao novo tempo da presença divina em meio ao mundo. Relaciona-se com seus semelhantes numa forma direta, seja nas suas palavras, seja na ajuda em situações de doença, seja na comunidade de mesa, seja no perdão e na expulsão do Mal. A culminância dessa doação se dá na entrega da vida e está simbolizada no gesto de lavar os pés. Lavar os pés exprime o condição de ser discípulo ou discípula de Jesus e exprime concretamente o significado do amor ao próximo, que é o seu mandamento.
O processo contra Jesus essencialmente é contra sua forma de vivência da fé judaica enquanto escuta e aceitação da aliança divina e enquanto fidelidade radical ao Pai, mesmo às custas de autoridades religiosas e políticas. Nesse contexto, ele mesmo se despede deixando o Memorial de sua existência a ser concluída com a subtração da vida por essas mesmas autoridades e pela forma blasfema de vivência religiosa presente no ambiente em que vivida. Jesus não é simplesmente executado, mas ele mesmo aceita o ser sacrificado pelos poderes representantes da maldade humana, do egoísmo e da vontade de subjugação. As autoridades e setores da sociedade do seu tempo queriam um Messias que reforçasse as forças de opressão e exploração das pessoas. Contudo, Jesus aparece como Messias servidor, aquele que dá vida pelos pobres, pecadores, estrangeiros, doentes, desabrigados e desprotegidos. E como insiste o evangelho de João, sua morte é sua condição de pão e bebida de vida e sangue, corpo e sangue alimento para a vida eterna. A paixão e morte de cruz são a mesa posta para a humanidade como serviço extremo de entrega. São o coroamento de sua passagem na história humana, desde a encarnação. O Filho entrega a si mesmo como alimento para a vida nova da humanidade.
A solenidade do Corpo e Sangue do Senhor, quer lembrar a permanência de Jesus como lembrança permanente do modo cristão de ser e viver no mundo. Caminhar processionalmente ou afirmar a realidade de sua presença, nada mais é do que comprometer-se em viver em cada celebração o desafio da doação radical e final. Neste sentido, não se trata de uma “marcha” com “qualquer Jesus”, e sim de um testemunho em favor dos mais frágeis; não a favor de um sistema de poder, mas de serviço; não a favor de uma opção de violência, mas a favor de não violência ao ponto de entregar a sua própria vida. Crer na presença real de Jesus na Eucaristia, significa aceitar a permanência da diaconia divina em nossa própria vida.
Fonte: Revista Integração Diocesana, Ed. 447.