Caros diocesanos. Para nós cristãos, setembro é o mês da Bíblia, que contém a Palavra de Deus. Hoje desejamos destacar o verdadeiro valor desta Palavra que Deus dirige a nós. Desde o Antigo Testamento, esta Palavra foi comunicada ao Povo de Deus e quando chegou a plenitude dos tempos, Jesus Cristo, o Verbo (a Palavra), se fez carne e veio habitar entre nós (Jo 1, 14). Nos tempos da Igreja ela continua a ser proclamada em todas as celebrações litúrgicas. O Concílio Vaticano II, no documento Dei Verbum, destaca seu valor com os seguintes termos: “A Igreja sempre venerou as divinas Escrituras, da mesma forma como o próprio Corpo do Senhor, já que, principalmente na Sagrada Liturgia, sem cessar toma da mesa da Palavra de Deus quanto do Corpo do Cristo o Pão da vida, e o distribui aos fiéis” (DV 21). Quando o documento Sacrosanctum Concilium fala da presença de Cristo na celebração litúrgica, nós lemos: “Presente está pela Sua palavra, pois é Ele mesmo que fala quando se leem as Sagradas Escrituras na Igreja” (SC 7). O mesmo documento ainda afirma: “A liturgia da Palavra e a liturgia eucarística estão tão estreitamente unidas, que formam um único ato de culto” (SC 56). Portanto, a veneração da Palavra é inquestionável, mesmo que não se lhe deu o mesmo valor de culto na história da Igreja. Prova disto é nossa dificuldade em participarmos de uma Celebração da Palavra, fora da missa. Não lhe damos a devida cidadania, como forma privilegiada de encontro com o Senhor. Parece que celebração só pode ser de eucaristia, sem negar que esta é a forma por excelência de tornar o Senhor presente na ação litúrgica. Mas devemos valorizar e incentivar também as celebrações da Palavra de Deus em nossas comunidades, não simplesmente como um mal necessário pela falta de sacerdotes, mas como verdadeiras celebrações litúrgicas. O Documento de Aparecida valoriza assim a presença pascal do Senhor para os fiéis na celebração da Palavra: “Podem alimentar seu já admirável espírito missionário participando da ‘celebração dominical da Palavra’, que faz presente o Mistério Pascal no amor que congrega (1Jo 3, 14), na Palavra acolhida (cf. Jo 5, 24-25) e na oração comunitária (cf. Mt 18, 20)” (DAp 253). Ao dar verdadeiro sentido à celebração da Palavra, valoriza-se também os sacramentos, dos quais ela é fundamento e parte constitutiva.
Para ajudar-nos na reflexão recorramos à era patrística. No séc. III Orígenes já afirma: “...Se tomam tanto cuidado para guardar o seu Corpo - e têm razão - como podem então pensar que seja uma culpa menor, desprezar a Palavra de Deus?”. No século V, S. Jerônimo diz: “... o evangelho é o corpo de Cristo, e as Sagradas Escrituras são sua doutrina... seu verdadeiro corpo e seu verdadeiro sangue é também a palavra das escrituras e sua doutrina”. Igualmente escreve S. Agostinho: “Bebe-se o Cristo no cálice das Escrituras como no cálice Eucarístico”, e ainda: “O verdadeiro Cristo está na sua Palavra e na sua carne”. Cesário de Arles (séc. VI) continua a pensar como os antecessores: “A Palavra de Cristo não é menor do que o Corpo de Cristo”. Nestes textos vemos a sacramentalidade da Palavra de Deus. Que eles nos ajudem a celebrar melhor e encontrar o Senhor presente na Palavra.
A nova primavera da Palavra de Deus nos ajude no processo da Iniciação à Vida Cristã; seja motivo para crescermos no seu conhecimento (formação); torne-se a Palavra preferida de nossa oração (celebrações litúrgicas, Leitura Orante); seja ela fonte que nos envia em missão evangelizadora, como discípulos missionários (palavra e testemunho de vida).
Dom Aloísio A. Dilli,
Bispo de Santa Cruz do Sul