Caros diocesanos. Uma das atitudes mais lindas e nobres da pessoa humana é a solidariedade. Ser solidário significa ter compaixão (passio + cum = sofrimento com), estar unido à situação difícil de alguém. Na linguagem teológica podemos dizer que Deus foi solidário com a humanidade ao encarnar-se, ao tornar-se um de nós: veio habitar entre nós, assumindo nossa condição a fim de nos reerguer, de nos salvar. Este é o sentido profundo da sua encarnação, que celebramos no santo Natal. E este será também o sentido último da Páscoa de Jesus Cristo, passagem da morte para a vida. Deus assume nossa fragilidade até o sofrimento e a morte, abrindo as portas para a ressurreição.
A solidariedade pode ser entendida também como ter misericórdia (miséria + coração): colocar o coração junto à miséria do outro/a. É por isso que a Sagrada Escritura fala tantas vezes que Deus é misericordioso ou que teve misericórdia com seu povo. Esta atitude de solidariedade, de compaixão ou de misericórdia é típica de Deus, pois ela revela total gratuidade, doação, amor. Deus é assim para conosco. Ele nos salvou, não por merecimento nosso, mas porque nos ama (cf. Ef 2, 8-9).
Se nós fomos criados à imagem e semelhança de Deus (cf. Gn 1, 27), também possuímos a capacidade, mesmo limitada, de ter atitudes que chamamos divinas. O verdadeiro amor doação, como Jesus nos ensinou (cf. Jo 15, 13), é de característica divina. Por isso, podemos afirmar que há sinais divinos, quando vemos pessoas serem solidárias em catástrofes, ajudando de diversas formas, como em enchentes, incêndios, acidentes, doenças, pandemia, mortes. Mas, sobretudo, há sinais de Deus nos gestos solidários e de misericórdia que pessoas manifestam para seus semelhantes no dia-a-dia da vida, seja para amenizar situações de emergência, seja para dignificar a vida pelo respeito, pela valorização, pela busca de melhores condições, pela promoção humana em todos os sentidos. Isso significa lutar por um mundo mais justo e fraterno, onde não haja mais excluídos ou condenados à vida miserável, enfim, dando chances para todos dignificarem sua vida. Isso não acontece, simplesmente, dando o peixe pescado, mas ensinando a pescar, proporcionando as oportunidades necessárias. Significa, ainda, não privilegiar apenas poucos, ou certos grupos, mas buscar o bem comum da sociedade, dignificando a vida de todos, sobretudo em suas necessidades básicas.
Estamos novamente nos aproximando da Quaresma – tempo de preparação para a Páscoa. Esse tempo de conversão nos poderá ajudar, sob a ação do Espírito Santo, para identificar os sinais de Deus já acontecendo na realização de seu Reino, através do cuidado com a vida; mas também para perceber os apelos de Deus, onde Ele nos interpela para a busca de mudança, de transformação. No ano de 2023, podemos perguntar-nos: Quais os sinais dos tempos em relação à Campanha da Fraternidade, que nos faz refletir sobre “Fraternidade e Fome”, com o lema: “Dai-lhes vós mesmos de comer”!
Com a Igreja do Brasil, que mais uma vez é convocada a ser solidária, a ter compaixão e misericórdia, sobretudo com os que passam fome, rezemos: “Confiantes na ação do Espírito Santo, vos pedimos: inspirai-nos o sonho de um mundo novo, de diálogo, justiça, igualdade e paz; ajudai-nos a promover uma sociedade mais solidária, sem fome, pobreza, violência e guerra; livrai-nos do pecado da indiferença com a vida. Que Maria, nossa mãe, interceda por nós para acolhermos Jesus Cristo em cada pessoa, sobretudo nos abandonados, esquecidos e famintos. Amém”.
Bom início de Quaresma para todos!
Dom Aloísio Alberto Dilli - Bispo de Santa Cruz do Sul