Caros diocesanos.
Já discorremos anteriormente sobre o sentido da quaresma e seus objetivos
gerais de conversão de vida, de preparação para a Páscoa. Na presente mensagem
pretendemos continuar a reflexão sobre a Quaresma e a Campanha da Fraternidade
que, em 2023, volta ao tema da fome. Antes de tudo, desejamos manifestar nossa
fome de Deus, buscando estar com Ele para participar de seu amor e de sua
misericórdia. Mas também precisamos dar atenção ao tema da fome de alimento
digno, o qual torna-se um desafio social, humanitário para a sociedade inteira.
Isso nos é lembrado pelo lema da Campanha da Fraternidade, frase do evangelho
da Multiplicação dos Pães: “Dai-lhes vós
mesmos de comer!” (Mt 14, 16b). O que nos faz entender que o evangelho tem
profunda incidência social.
Entre as
principais causas da fome em nosso país, o texto-base da CNBB cita a estrutura
fundiária, com sua injusta distribuição da terra; o sistema produtivo a serviço
do mercado internacional e não da alimentação e nutrição da população; o
desemprego e o subemprego, sem as necessárias seguranças institucionais; a
perversa política salarial, que não dá o devido acesso ao consumo; a corrupção,
que desvia os recursos, inclusive da alimentação; o desmonte do sistema
nacional de segurança alimentar e nutricional, que facilitavam o alimento
saudável, produzido pela agricultura familiar, e outros (cf. TB, n. 45ss). O
texto-base conclui, dizendo: “As raízes
da fome estão, especialmente, na distribuição iníqua da renda e das riquezas,
que se concentram nas mãos de poucos, deixando, na pobreza, enormes
contingentes populacionais nas periferias urbanas e nas áreas rurais” (TB,
n. 54). Neste sentido, o Papa Francisco afirma: “Quando a especulação financeira condiciona o preço dos alimentos,
tratando-os como uma mercadoria qualquer, milhões de pessoas sofrem e morrem de
fome... A fome é criminosa, a alimentação é um direito inalienável” (FT, n.
189).
A fome não ameaça
apenas a vida das pessoas, mas também a sua dignidade e traz as mais diversas
consequências, como: debilidade física e psíquica, apatia, perda do sentido
social, indiferenças, hostilidade com os mais frágeis (como crianças e idosos),
violência doméstica, destruição da família, emigração por necessidade e,
finalmente, a perda do sentido da vida e a criminalidade. Essa realidade conduz
a crianças raquíticas, obesas, com deficiências irremediáveis no
desenvolvimento intelectual e vulneráveis a doenças. As alternativas da
alimentação dos pobres conduzem facilmente a doenças crônicas, tanto no sentido
somático quanto mental, como a depressão e a ansiedade. As principais vítimas
serão sempre as crianças e os idosos.
A Campanha da
Fraternidade incentiva relações humanas cada vez mais solidárias em nossas
comunidades, de partilha aos necessitados, de cuidado ecológico da casa comum,
de combate ao uso desordenado dos agrotóxicos, do apoio às hortas comunitárias
e da produção de alimentos saudáveis, do combate à cultura do desperdício,
A educação
alimentar e a alimentação saudável devem iniciar na família. É no ambiente
familiar que se aprende a combater a indiferença e o cultivo da partilha, da
fraternidade, da solidariedade. Os pais e avós são importantes na educação de
atitudes de caridade com os necessitados. Este processo educativo deverá
prosseguir na escola, sobretudo em relação à merenda escolar e nas
oportunidades de educação no campo da saúde. Na próxima semana, continuaremos
nossa reflexão sobre a Quaresma e a temática da Fraternidade e Fome.
Dom Aloísio
Alberto Dilli – Bispo de Santa Cruz do Sul