Caros diocesanos.
Já é do nosso conhecimento que a Campanha da Fraternidade é o modo brasileiro
de celebrar a quaresma. Sabemos também que a Campanha da Fraternidade não
substitui a quaresma, mas é parte importante dela, proporcionando um espírito
de conversão pessoal, comunitária e social em relação a determinado aspecto da
realidade. O tema de 2023 é Fraternidade
e Fome. Antes de tudo, desejamos manifestar fome de Deus, buscando estar
com Ele para participar de seu amor e de sua misericórdia. Nos tempos difíceis
que vivemos, sobretudo da crise de polarização e outras formas de
distanciamento, temos fome de paz, fraternidade, verdade, concórdia e tudo o
que nos humaniza.
Mas também existe
uma outra forma de fome, aquela em que o nosso organismo sente falta do
necessário para viver dignamente. Por isso, essa fome de alimento digno é um
desafio social, humanitário para a sociedade inteira. Referindo-se ao evangelho
da Multiplicação dos Pães (cf. Mt 14,14-21), afirma o presidente da CNBB, Dom
Walmor O. de Azevedo: “Jesus abre os
olhos e os corações destes mesmos discípulos para que não se justifiquem diante
da impossibilidade, mas compreendam que a mudança da realidade começa com
eles... Ele aponta para a necessidade de agir conjuntamente, ainda que as
dificuldades sejam grandes e os recursos pequenos” (Apresentação do
Texto-Base – TB, p. 7).
O objetivo da
Campanha da Fraternidade 2023 é assim descrito: “Sensibilizar a sociedade e a Igreja para enfrentarem o flagelo da fome,
sofrido por uma multidão de irmãos e irmãs, por meio de compromissos que
transformem esta realidade a partir do Evangelho de Jesus Cristo” (TB, p.9).
Este objetivo faz eco em relação aos objetivos permanentes da Campanha da
Fraternidade: 1) despertar o espírito comunitário e cristão na busca do bem
comum; 2) educar para a vida em fraternidade; 3) renovar a consciência da
responsabilidade de todos pela ação evangelizadora, em vista de uma sociedade
justa e solidária. Deus nos coloca como seus colaboradores na ordem da criação.
Os bens criados por Ele têm uma destinação universal. O uso egoísta e
exclusivista das riquezas da criação, esquecendo-se dos irmãos, não é
compatível com a fé cristã.
A Campanha da
Fraternidade sempre é inspirada pela Palavra de Deus. Neste ano o lema é uma
frase do evangelho da Multiplicação dos Pães: “Dai-lhes vós mesmos de comer!” (Mt 14, 16b). O Senhor vai ao
encontro das necessidades das pessoas humanas e deseja tornar cada um de nós
participante de sua compaixão. A tendência dos discípulos é lavar as mãos
diante das necessidades dos outros, aconselhando Jesus a mandar as multidões
embora. Neste contexto, Jesus ensina a lógica da partilha e da solidariedade,
quando o pouco, colocado a serviço de todos, se torna muito. Quando a partilha
é praticada há alimento para todos.
A fome no Brasil
se tornou um fenômeno social e coletivo, estrutural, produzido e reproduzido no
curso ordinário da sociedade. Diz o Texto-Base que a sociedade normatiza e
naturaliza a desigualdade, tornando-se um projeto de manutenção da miséria em
vista da perpetuação no poder (cf. TB, n. 30). Na visão cristã, isto é um
verdadeiro escândalo. E ainda há quem considere que os temas sociais não têm a
ver com a vida cristã. A quaresma e a Campanha da Fraternidade nos auxiliam a entender
que o evangelho tem profunda incidência social.
O texto-base
afirma que os direitos humanos decorrem da dignidade da pessoa humana, criada à
imagem e semelhança de Deus. Por isso devem ser asseguradas a ela condições
básicas que lhe permitam levar uma vida digna, como o direito à alimentação.
Dom Aloísio
Alberto Dilli – Bispo de Santa Cruz do Sul