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21/03/2023 - QUARESMA E CAMPANHA DA FRATERNIDADE - PARTE 4

Caros diocesanos. Certamente já nos é familiar que o tema da Campanha quaresmal de 2023 é Fraternidade e Fome. Não podemos permanecer indiferentes diante de tantos irmãos e irmãs que passam fome e não tem vida digna, sofrendo sérias consequências no presente e no futuro, como acentuamos em mensagens anteriores. Para a solução do problema da fome, não bastam ações ocasionais ou de ajudas de emergência, por mais importantes que estas possam ser, mas é necessário corrigir questões estruturais que provocam a constante situação de fome.

Nossa reflexão de hoje vai ao encontro da Palavra de Deus para buscar luzes e indicar caminhos de esperança. O lema da Campanha já interpela para soluções concretas, impelindo para a consciência da partilha e da solidariedade: “Dai-lhes vós mesmos de comer!” (Mt 14, 16). Já os profetas bíblicos denunciam a falta de cuidado e responsabilidade por aqueles que não têm o pão necessário. Já era central no judaísmo que o amor a Deus devia ser traduzido no amor ao órfão, à viúva e ao estrangeiro. A atuação de Jesus também revela, por palavras e gestos, sua predileção pelos pobres e famintos, como destinatários urgentes para que tenham o necessário a uma vida digna. Esta é igualmente a prática das primeiras comunidades cristãs, as quais se caracterizam pela comunhão na fração do pão eucarístico (cf At 2, 42-46) e onde todos eram corresponsáveis pelas necessidades mútuas. Um texto muito claro dessa relação da eucaristia e o amor mútuo se apresenta na carta de São Paulo à comunidade de Corinto (1Cor 11, 17-34): “A despreocupação com as necessidades alheias invalida o reto propósito da celebração da Ceia e, dentre tais necessidades, a mais evidente é a fome” (TB, n. 124). No cristianismo, portanto, a misericórdia e o amor cristãos impelem para a partilha do muito ou do pouco que se tem. O compromisso é de todos.

O evangelho da multiplicação dos pães, texto referencial para a Campanha da Fraternidade de 2023, tem como centro de ensinamento a ordem de Jesus, que conclama à responsabilidade todos os seus discípulos: “Dai-lhes vós mesmos de comer!” (Mt 14, 16). O ensinamento dado pela Palavra deve levar à preocupação com o pão para quem não o tem.

Animados pela Sagrada Escritura, é imperativo que tenhamos a coragem de assumir uma postura profética diante da fome de tantos irmãos e irmãs: “O grande deserto da Quaresma pede de nós uma revisão crítica da vida, que se faz em uma dimensão individual, olhando para nós mesmos e para nosso relacionamento com o Senhor, mas que também se faz em uma dimensão relacional, olhando para a forma como habitamos nosso mundo e nossa sociedade, a forma como nos sentimos responsáveis pelos nossos irmãos” (TB, n.137). Dentro deste contexto, é preciso também relacionar a eucaristia e a responsabilidade social. A eucaristia não pode apenas conduzir a uma conversão individualista e interior, sem considerar os que estão ao nosso lado. Ajuda-nos São João Crisóstomo nesta reflexão: “Enquanto adornas a casa do Senhor, não deixes o teu irmão na miséria, pois ele é um templo e de todos o mais precioso” (TB, n.149). Da mesma forma recorremos à palavra de Bento XVI: “A união com Cristo, que se realiza no sacramento, habilita-nos também a uma novidade de relações sociais: a mística do sacramento tem um caráter social, porque (...) a união com Cristo é, ao mesmo tempo, união com todos os outros aos quais Ele se entrega” (TB, n.151). E o Papa Francisco conclui: “Não podes partir o Pão do domingo, se o teu coração estiver fechado aos irmãos. Não podes comer este Pão, se não deres o pão aos famintos. Não podes partilhar deste Pão, se não partilhas os sofrimentos de quem passa necessidade” (TB, n. 154).

Dom Aloísio Alberto Dilli – Bispo de Santa Cruz do Sul