Caros
diocesanos. Na mensagem anterior, vimos o contexto histórico em que surgiu a
Via-Sacra, normalmente considerada como um exercício de piedade, muito
apreciado pelos fiéis, com o objetivo de acompanhar os passos da condenação,
paixão e morte de Jesus Cristo, através de leituras bíblicas, de meditação e de
oração. As diversas estações evocam o caminho percorrido por Jesus nos últimos
momentos de sua vida e que culminaram com a ressurreição, trazendo-nos a
salvação.
Se no programa
anterior lembramos os aspectos históricos de seu surgimento, hoje queremos
refletir mais sobre o sentido da Via-Sacra. Ela é recomendada pela Igreja, devido
ao seu alto valor como meditação da Paixão do Senhor. Atualmente encontramos
grande variedade de textos e de temáticas para a Via-Sacra. Os textos mais
tradicionais, com forte acento ao realismo descritivo do sofrimento dos
personagens em evidência, seguem muitas vezes linguagens de piedade individual
e que podem conduzir a sentimentalismos exagerados. Tendo como orientação a
reforma litúrgica do Concílio Vaticano II, hoje encontramos ricos textos de
Via-Sacras, com farta distribuição de leituras bíblicas, acompanhadas de
orações, meditação e canto, que, não poucas vezes, nos colocam bem próximos de
verdadeiras celebrações litúrgicas da Palavra, realizadas na fé e no amor da
comunidade eclesial (cf. DAp 253). Em nossos dias, com a insistente reflexão
sobre o compromisso a que deve levar a Palavra, a oração e a meditação cristã,
encontramos Via-Sacras com conteúdo de acentuado compromisso social, apontando
os grandes clamores ou urgências do mundo atual, que prolongam a agonia e a
morte de Jesus em seus membros sofredores. No Brasil, isso acontece normalmente
com a Campanha da Fraternidade, que convida os fiéis a refletir, rezar e
assumir algum aspecto específico da vida do povo de Deus, onde continua a longa
via-crucis de condenações, quedas,
encontros/desencontros, dores e mortes. Em 2023, o tema foi Fraternidade e Fome. A Via-Sacra do
subsídio do Regional Sul 3 nos fez rezar assim, numa das estações (p. 43): “Senhor, queremos assumir nossa cruz e
seguir-vos! Sabemos que convosco ela se torna leve e carregada de esperança.
Com vossa presença, a cruz da partilha e da solidariedade garante a
ressurreição para nós e para tantas vidas ameaçadas de morte pela fome e o
abandono. Amém!”.
Em síntese,
podemos dizer que a Igreja incentiva a Via-Sacra (caminho sagrado) ou
Via-Crucis (caminho da cruz) como um exercício de piedade de grande valor, especialmente
para a meditação da paixão de Jesus Cristo, relacionada com a paixão da
humanidade. Sabemos que o mistério da morte e ressurreição do Senhor Jesus é
especialmente tornado presente nas celebrações litúrgicas sacramentais, mas
estamos também cientes que a reflexão e meditação, como da Via-Sacra, são meios
que ajudam a levar os fiéis a celebrar com mais fervor e fruto os mistérios
centrais do culto cristão. A liturgia celebra, torna presente o que a Via-Sacra
e outras devoções meditam, rezam, conscientizam. Quanto mais a Via-Sacra for
enriquecida com a proclamação da Palavra de Deus, sobretudo com textos que dão
sentido às diversas estações, ela qualificará sua meditação e oração. É também sumamente
importante que a Via-Sacra não perca a unidade do mistério pascal, ressaltando
a morte e a ressurreição. Se isso não está implícito nas 14 estações,
acrescente-se a 15ª estação com este tema. Que ela não seja uma devoção que nos
aliene da vida real em que há tantos membros sofredores que suplicam por vida mais
digna. Que as nossas Via-Sacras nos convidem sempre mais a seguir o amor de
Jesus, que deu sua vida para nos salvar, tendo aos pés da cruz, sua e nossa Mãe,
a Virgem Maria.
Dom Aloísio Alberto
Dilli - Bispo de Santa Cruz do Sul