Caros diocesanos. Seguindo com nosso estudo do documento papal Desiderio Desideravi, continuamos hoje com o tema da “ars celebrandi” - a arte de celebrar. Há muitas maneiras como uma assembleia participa da celebração (cf. Ne 8, 1ss), pois a arte de celebrar atinge todos os batizados. São gestos e palavras que colocam ordem em nosso mundo interior, fazendo-nos viver certos sentimentos, atitudes e comportamentos; enfim, uma ação que envolve o corpo em sua totalidade. Neste contexto, o silêncio ocupa um lugar de absoluta importância: “O silêncio litúrgico é algo muito mais grandioso: é símbolo da presença e da ação do Espírito Santo que anima toda a ação da celebração... O silêncio transforma-se na dor do pecado e no desejo de conversão. Desperta uma prontidão para ouvir a Palavra e desperta a oração. Ele nos dispõe a adorar o Corpo e Sangue de Cristo. Sugere a cada um, na intimidade da comunhão, o que o Espírito efetuaria em nossas vidas para nos conformar ao Pão partido. Por tudo isso, somos chamados a realizar com extremo cuidado o gesto simbólico do silêncio” (n. 52). Até o ajoelhar-se deve ser feito com arte, com plena consciência do seu sentido simbólico e da necessidade que temos deste gesto para expressar o nosso modo de estar na presença do Senhor. E que arte somos chamados a aprender para o digno anúncio da Palavra, para ouvi-la, para deixá-la inspirar nossa oração, para torná-la nossa própria vida. Cada gesto e cada palavra da celebração merece a máxima atenção; isso formará nossa personalidade cristã, seja pessoal como da comunidade.
Se a
arte de celebrar deve atingir a todos, mais ainda devem ter solicitude por ela
os que presidem as celebrações: “Há modos inadequados como austeridade rígida
ou criatividade exasperante, um misticismo espiritualizante ou um funcionalismo
prático, uma vivacidade apressada ou uma lentidão exagerada, um descuido
desleixado ou um capricho excessivo, uma amizade superabundante ou uma
impassibilidade sacerdotal” (n.54). A inadequação desses modelos de presidência
tem uma raiz comum: um personalismo acentuado do estilo celebrativo que
expressa uma mania mal disfarçada de ser o centro das atenções, mais evidente
quando as celebrações são transmitidas pelos meios de comunicação, algo nem
sempre oportuno e que precisa de mais reflexão. Os mesmos cuidados são
esperados da homilia e de outros atos da presidência, conferidos pela ação do
Espírito Santo na ordenação, tornando-se presença particular do Senhor
ressuscitado: Este fato confere um certo peso ‘sacramental’ a todos os gestos e
palavras de quem preside: “A assembleia tem o direito de poder sentir naqueles
gestos e palavras o desejo que o Senhor tem, hoje como na Última Ceia, de comer
a Páscoa conosco. Então, o Senhor ressuscitado está no papel principal, e não
nossas próprias imaturidades, assumindo papéis e comportamentos que
simplesmente não são apropriados” (n. 57). A norma mais exigente é a própria
eucaristia. Quem preside a eucaristia tem a força, em nome de todo o povo
santo, para recordar diante do Pai a oferta de seu Filho na Última Ceia, para
que aquele imenso dom se torne novamente presente no altar.
Sendo a
vida cristã uma jornada contínua de crescimento, somos chamados a deixar-nos
formar na alegria e na comunhão, elevando aos céus, na variedade das línguas,
uma única e mesma oração. A ação litúrgica da Igreja exprime a nossa unidade e
se torna nossa primeira fonte de espiritualidade. No final do documento o Papa
Francisco ainda nos convida a redescobrir novamente o sentido do Ano Litúrgico
e do Dia do Senhor. E conclui, dizendo: “Cuidemos da nossa comunhão.
Continuemos a nos maravilhar com a beleza da Liturgia. O mistério pascal nos
foi dado. Deixemo-nos envolver pelo desejo que o Senhor continua a ter de comer
a sua Páscoa conosco” (n. 65). Boas celebrações!
Dom Aloísio Alberto Dilli - Bispo de Santa Cruz do Sul