Caros diocesanos.
Na mensagem anterior iniciamos a reflexão sobre a Carta Apostólica Desiderio Desideravi, em que o Papa
Francisco convida toda a Igreja para redescobrir, salvaguardar e viver a
verdade e a força da celebração cristã. Já refletimos aspectos gerais de
liturgia, sobretudo o hoje da
história da salvação e a liturgia como lugar de encontro com Cristo.
Na
presente mensagem continuamos o estudo do documento papal, abordando a Igreja
como Sacramento do Corpo de Cristo. O Concílio Vaticano II, em seu primeiro
documento: Sacrosanctum Concilium
(04/12/1963), nos recorda que a Igreja nasce do lado de Cristo, perfurado pela
lança, no alto da cruz. É o nascimento da nova Eva, a Igreja: “Foi do lado de Cristo que dormia o sono da
morte sobre a cruz que saiu ‘o maravilhoso sacramento de toda a Igreja’”
(n. 14). Pelo batismo nos tornamos ‘filhos
no Filho’, participando do Corpo místico de Cristo, também sujeitos da ação
litúrgica: “O sujeito que atua na
Liturgia é sempre e somente Cristo-Igreja” (n. 14). A base teológica da
liturgia é fundamental para a unidade e para que a ação sagrada alcance a
plena, consciente, ativa e fecunda participação (SC 11 e 14); da mesma forma
evita uma compreensão superficial ou até seja explorada a celebração litúrgica com
intenções ideológicas ou outras.
O
Papa Francisco ainda acentua que a liturgia é um antídoto para o veneno do
mundanismo espiritual, expresso sobretudo pelo gnosticismo e o neopelagianismo.
O primeiro reduz a fé cristã ao subjetivismo, aos próprios pensamentos e
sentimentos; o segundo anula o papel da graça e conduz ao elitismo e classifica
os outros de forma autoritária. A verdadeira liturgia nos mostra que a ação
celebrativa não pertence ao indivíduo, mas à Igreja-Cristo, à totalidade dos
fiéis, unidos em Cristo. Neste particular, o Papa Francisco afirma: “A liturgia não diz ‘eu’, mas ‘nós’, e
qualquer limitação na amplitude desse ‘nós’ é sempre demoníaca” (n.19).
Portanto, a liturgia nada tem a ver com moralismos ascéticos, mas constitui-se
no dom pascal que, recebido com docilidade e gratuidade, renova a nossa vida.
A
liturgia nos faz descobrir sempre de novo que nela acontece o sacerdócio de
Cristo, revelado no seu mistério pascal e tornado presente e ativo por meio de
sinais. Pela ação do Espírito todas as dimensões de nossa vida vão sendo
conformadas cada vez mais a Cristo. Isso não se resolve apenas com rigorosa
estética ritual, com observâncias exteriores ou fidelidade impecável às
rubricas, mesmo que tudo isso possa ser importante, mas não suficiente para
tornar plena a participação.
Outro
tema essencial do ato litúrgico, abordado pelo Santo Padre, é o assombro ou
maravilhamento diante do mistério pascal de Cristo para nos salvar e sua
possível celebração pelos sacramentos. Assim percebemos que o encontro com Deus
não é fruto de uma busca interior individual por Ele, mas é um acontecimento
dado a nós, diante do qual nos maravilhamos e que nos incentiva para ações de
louvor, de ação de graças, de adoração. Afirma Papa Francisco, no citado
documento: “A maravilha é parte essencial
do ato litúrgico” (n. 26).
Na
próxima semana, continuaremos com nossa reflexão a partir do documento do Papa
Francisco sobre a sagrada liturgia. Que o estudo e o aprofundamento nos ajudem
a celebrar melhor.
Dom Aloísio
Alberto Dilli – Bispo de Santa Cruz do Sul