Caros diocesanos. Já refletimos, em mensagem anterior, que é sobretudo a eucaristia que torna o Senhor morto e ressuscitado (Páscoa) presente entre nós. No ano da eucaristia em nossa diocese, desejamos aprofundar esse tema, pois a eucaristia assume a centralidade na vida litúrgica da igreja. João Paulo II, na Carta encíclica Eclesia de Eucaristia (EdeE), afirma, já no título, que a Igreja vive da eucaristia, tornando-se o próprio núcleo de seu ministério, forma de presença com intensidade sem par (EdeE 1). Ela é a fonte e o centro de toda vida cristã (LG 1); nela está contido todo o tesouro espiritual da Igreja (PO 5). Através dela o próprio Cristo eterniza sua Páscoa no hoje da história de todos os tempos.
A Espiritualidade eucarística revela diversos aspectos ou dimensões em sua unidade indivisível: ela nasce numa Ceia pascal que torna presente (memória) o Sacrifício da Cruz e a Ressurreição de Cristo (Páscoa) realizando a maior Ação de Graças possível para a salvação da humanidade, em todos os tempos, tornando-se fonte e ápice de toda evangelização. Portanto, viver uma espiritualidade de Jesus eucarístico, longe de qualquer devocionismo ou intimismo, significa comungar sua vida, dada em sacrifício, tornando-nos, com Ele e os irmãos, oblação e ação de graças ao Pai em nossa missão evangelizadora.
Abordemos hoje a dimensão eucarística de Ceia de Comunhão: A Eucaristia nasceu numa ceia, na Última Ceia. Jesus disse aos apóstolos: “Tomai e comei”: Para o judeu o sentar à mesa e repartir o pão é privilégio dos familiares, dos amigos, dos próximos. Neste contexto nasce a primeira expressão: “Fractio panis” (Fração do pão). Consiste no ato de partir o pão em comum união (Comunhão) Todos comungam e participam do mesmo “Pão vivo descido do céu” (Jo 6, 51 e 1 Cor 10, 17), formando um só corpo: “epifania de comunhão” (MND 21). Esse convívio, essa partilha de comunhão e de vida renova constantemente a relação dos irmãos e das irmãs, já criada no batismo. É a teologia paulina do Corpo místico em ação (Cl 1, 18). Atua a autêntica relação pessoal (não intimista) com Jesus Cristo e com os irmãos (Igreja – Comunidade), fazendo acontecer uma espiritualidade de comunhão (NMI 43). É aqui que começamos a falar sobre temas como compromisso de solidariedade e de justiça, de fraternidade ou de vida fraterna em comum, de corresponsabilidade e de colegialidade, de perdão mútuo e de dignidade, como nos lembra a catequese do fim do primeiro século: “Reuni-vos no dia do Senhor para a fração do pão... Mas todo aquele que vive em discórdia com o outro, não se junte a vós antes de se ter reconciliado, a fim de que vosso sacrifício não seja profanado” (Didaqué 14, 1-2); veja-se também 1 Cor 11,17-29). Neste contexto podemos ainda lembrar a palavra da CNBB: “Uma comunidade insensível às necessidades dos irmãos e à luta para vencer a injustiça é um contratestemunho e celebra indignamente a própria liturgia” (DGAE 2008-2010, n. 178). Também João Paulo II dizia: “Se faltar a caridade, tudo será inútil... Nesta página, não menos do que o faz com a vertente da ortodoxia, a Igreja mede a sua fidelidade de Esposa de Cristo” (NMI 42 e 49). E conclui o Documento de Aparecida: “É uma dimensão constitutiva de nossa fé...” (DAp 257). Uma verdadeira assembleia eucarística é comprometida na comunhão com Cristo e com os irmãos e as irmãs. Portanto, “Não basta ter fé é preciso ser credível” (Card. Ravasi).
Dom Aloísio Alberto Dilli
Bispo de Santa Cruz do Sul